O que sabemos?
Efeito Dunning-Kruger.
Esse é um fenômeno estudado em psicologia cognitiva, descrito pelos pesquisadores David Dunning e Justin Kruger em 1999. O efeito Dunning-Kruger mostra que pessoas com baixa habilidade ou pouco conhecimento em uma área tendem a superestimar sua própria competência, enquanto pessoas mais experientes ou especialistas costumam subestimar sua capacidade, por reconhecerem a complexidade do assunto.
Em resumo:
- Iniciantes: sabem pouco, mas acham que sabem muito.
- Especialistas: sabem muito, mas percebem que ainda há muito a aprender, então tendem a ser mais humildes em suas avaliações.
É comum representarem esse efeito em um gráfico chamado “a montanha da estupidez”, onde a confiança sobe rapidamente no início, depois despenca quando a pessoa percebe sua ignorância, e só volta a subir lentamente com aprendizado real.
A sabedoria do Altíssimo não habita em qualquer consciência, nem se alcança apenas pelo acúmulo de conhecimento humano. Pois a Sabedoria é viva, como uma pessoa, e manifesta-se conforme a vontade do Pai. Ela é uno com Ele, e n’Ela não há mudança nem sombra de variação.
Muitas vezes o homem é como um iniciante. No meu mundo, por exemplo, o da programação, há aqueles que se acham quase deuses; outros reconhecem que não sabem muito, mas usam o pouco que sabem como se fosse um título de superioridade sobre os demais. Existem também os que nada sabem de fato e, por fim, os que sabem muito, mas, com a humildade de um monge, procuram ensinar aos outros tudo o que aprenderam. É nesse pequeno mundo que medito sobre todas essas coisas.
Olhar para as pessoas, procurar entendê-las e também me entender, usando a Palavra de Deus para refinar meu olhar — é assim que reconheço meus erros e minhas faltas. Por isso, minhas orações em busca de perdão não são hipocrisia nem falsa confissão, mas fruto da consciência de quão falho realmente sou.
Até mesmo nas pessoas mais altruístas é possível perceber o cansaço da carne, que por vezes as leva a descuidar do outro em busca da própria preservação emocional.
Quando volto meu olhar para outros contextos da vida, percebo que, no fundo, não somos tão diferentes assim. Aprendo muito ao meditar sobre a vida, buscando compreender a Sabedoria em cada detalhe do cotidiano. Quando me coloco na janela do prédio onde moro e observo, lá do alto, as pessoas tão pequeninas, os inúmeros carros nas ruas, as casas sem fim — cada uma com sua história, suas alegrias e dores, famílias unidas e desunidas, igrejas espalhadas pelos bairros — é então, nesses instantes, que medito na Palavra, em busca de compreensão, entendimento e sabedoria.
Seja no trabalho, na vida dos amigos e conhecidos, na minha família ou mesmo do alto de um prédio, nem sempre enxergo a Sabedoria de Deus. Ainda assim, consigo perceber a bondade d’Ele atravessando todas essas realidades. Ao mesmo tempo, vejo a maldade, a humildade, a estupidez, a ganância, a soberba… e também o consolo. Mesmo no caos, é possível notar, ao menos, o desejo de que Ele esteja presente; caso contrário, tudo pareceria tão frágil, como uma ordem que, ao se desalinhar, traria uma destruição imparável.
Tudo isso lhe soa familiar?
Em muitas épocas, aguardamos ansiosos o Reino de Deus, ainda que fosse dito:
“O Reino de Deus não vem com aparência exterior. Nem dirão: Ei-lo aqui! ou: Ei-lo ali! Pois o Reino de Deus está dentro de vós (ou entre vós).” Lucas 17:20–21
“Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada. A ardente expectativa da criação aguarda a manifestação dos filhos de Deus.” Romanos 8:18–19
“O mistério que esteve oculto desde todos os séculos e em todas as gerações, e que agora foi manifesto aos seus santos; aos quais Deus quis fazer conhecer quais são as riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vós, a esperança da glória.” Colossenses 1:26–27
“Porque o Reino de Deus não consiste em palavras, mas em poder.” 1 Coríntios 4:20
Muitas vezes, ao ler um estudo de alguém, pulamos textos ou versículos que já conhecemos. Ainda assim, insisto: leiam-nos com atenção, pois há segredos revelados nessas palavras.
Para compreender melhor, vamos lembrar das palavras do Rei:
“E este evangelho do reino será pregado em todo o mundo, em testemunho a todas as nações, e então virá o fim.” Mateus 24:14
Falamos do evangelho, das boas novas, da Graça, do perdão, do favor imerecido, das instruções divinas que acompanham o Reino. Mencionamos o evangelho da circuncisão e o da incircuncisão, sobre os quais Paulo afirma não haver diferença (Gálatas 1:7).
Mas temos realmente uma compreensão clara dessas coisas, ou nos contentamos em criar imagens subjetivas e abstratas daquilo que lemos ou ouvimos?
O capítulo 24 de Mateus é o chamado Discurso do Monte das Oliveiras, onde Yeshua responde a três perguntas dos discípulos (Mt 24:3):
- Quando será a destruição do Templo?
- Qual será o sinal da Tua vinda?
- E do fim do mundo/era?
Yeshua descreve guerras, terremotos, perseguições, falsos messias e o aumento da iniquidade. No meio disso, Ele fala do evangelho do reino que precisa ser proclamado a todas as nações antes do fim.
Que “evangelho” é este?
A palavra “evangelho” (εὐαγγέλιον – euangélion) significa “boas novas”.
Mas não é qualquer evangelho (não é “um evangelho da graça desligado do Reino de Deus”). Yeshua fala do “Evangelho do Reino” (τὸ εὐαγγέλιον τῆς βασιλείας).
Ou seja:
- Não é apenas sobre salvação individual, mas sobre o governo de Deus sobre toda a criação.
- É o cumprimento das profecias do Tanach sobre o reinado de Deus através do Messias (Daniel 2:44; Isaías 52:7; Zacarias 14).
- Anuncia que YHWH é Rei, que Seu Messias governa, e que haverá restauração de Israel e das nações sob esse Reino.
Onde mais aparece “evangelho do Reino”?
Mateus destaca isso várias vezes:
- Mateus 4:23 – Yeshua pregava “o evangelho do Reino” e curava os enfermos.
- Mateus 9:35 – novamente, pregava o evangelho do Reino.
- Mateus 24:14 – será pregado em todo o mundo.
- Mateus 28:19-20 – a missão de discipular todas as nações (cumprimento dessa profecia).
Portanto, é um anúncio de que:
- O Reino já havia irrompido em Yeshua (presente).
- Mas ainda aguarda sua plenitude na vinda futura (escatológico).
Universalidade da mensagem
Yeshua conecta esse anúncio ao plano de Deus revelado a Abraão:
“em ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gn 12:3).
O evangelho do Reino não é apenas para Israel, mas para todas as nações (Isaías 49:6 – o Servo do Senhor é “luz para os gentios”).
“E então virá o fim”
Esse é um sinal escatológico: a proclamação global do Reino antecede a consumação da era.
- “Fim” aqui não significa “aniquilação do mundo”, mas o fim de uma era (αἰών – aiōn), e a inauguração plena da era messiânica.
O “evangelho” em Mateus 24:14 é o Evangelho do Reino de Deus – as boas novas de que YHWH reina, que Seu Messias Yeshua governa, e que o Reino será plenamente estabelecido sobre Israel e todas as nações. Esse anúncio precisa alcançar o mundo inteiro antes da consumação da era e da vinda final do Rei.
- Mateus 4:17
“Arrependei-vos, porque o Reino dos céus está próximo.”
Aqui Yeshua anuncia a chegada do Reino. A ênfase é no Reino de Deus que está próximo, ligado à Torah de Moisés, pois o arrependimento é chamado segundo a Lei.
- Mateus 4:23
“E percorria Jesus toda a Galileia, pregando o evangelho do Reino e curando todas as enfermidades e moléstias entre o povo.”
- Yeshua combina ensino sobre o Reino com ações concretas de restauração, mostrando que o Reino é vida, cura e justiça, não apenas palavras.
- Mateus 9:35
“E percorria Jesus todas as cidades e aldeias, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do Reino e curando toda enfermidade e moléstia entre o povo.”
- Reforça que o ensino estava sempre dentro da comunidade de Israel e baseado na Torah, mas trazendo o cumprimento messiânico.
- Mateus 24:14
“E este evangelho do Reino será pregado em todo o mundo…”
- Aqui vemos a missão universal: o Reino ainda é anunciado ao mundo todo.
O “evangelho do Reino” é a boa notícia de que o Reino prometido na Torah e pelos profetas está chegando com o Messias:
- Cumprimento de promessas a Abraão (Gn 12:3; Gn 22:18).
- Restabelecimento do governo de Deus sobre Israel e todas as nações (Daniel 2:44; Isaías 52:7).
Portanto: não é uma doutrina separada da Torah, mas a proclamação da Torah cumprida no Messias, com acesso a todas as nações.
O Evangelho do Reino, conforme anunciado por Yeshua, não é algo separado da Torah, mas a sua plena realização e cumprimento no Messias. Cada ensinamento de Yeshua, cada palavra de arrependimento e promessa de restauração, está enraizado nas Escrituras e revela a vontade do Pai para toda a criação.
Quando Yeshua diz:
“Está escrito: o homem não viverá só de pão, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mateus 4:4),
Ele nos lembra que a vida verdadeira não vem apenas de necessidades físicas ou de conceitos humanos de espiritualidade. A vida plena se encontra na obediência e na vivência da Palavra de Deus, que é a Torah e as promessas do Reino cumpridas em Yeshua.
Assim, o evangelho do Reino é boa notícia e caminho de vida:
- É a proclamação de que YHWH reina e que o Messias estabelece Seu governo.
- É uma vida guiada pelos princípios da Torah, agora revelados em seu cumprimento messiânico.
- É a promessa de que o Reino será plenamente manifestado a Israel e a todas as nações.
Portanto, anunciar o evangelho do Reino é anunciar a Torah viva em ação. Quem deseja viver no Reino não pode separar a mensagem do Messias da Palavra de Deus; pois, como Yeshua ensinou, a verdadeira vida depende de cada palavra que vem de Deus, e é nessa Palavra que encontramos sabedoria, restauração e a esperança escatológica que transcende os tempos.
Muitas vezes, nos deparamos com o que achamos que sabemos, confiantes em nosso próprio entendimento, sem percebermos o quanto nos falta. É o que a psicologia chama de efeito Dunning-Kruger: aqueles com pouco conhecimento tendem a superestimar sua competência, enquanto os mais experientes reconhecem a vastidão do que ignoram.
É nesse contraste que se revela a pureza da Sabedoria de Deus. Ela não se curva à ignorância nem ao orgulho humano; sua manifestação é íntegra, perfeita e independente de nossas avaliações. A verdadeira sabedoria não é apenas conhecer, mas permitir-se ser conduzido por Ela, reconhecendo que nossa compreensão é sempre limitada diante de Sua perfeição.